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Vozes do além

19 octubre, 2024

O vento uivava entre as árvores, arrastando folhas secas e sussurros que se misturavam em uma canção ominosa. Era a noite em que se dizia que os espíritos daqueles que morreram injustamente vagavam pelo mundo, buscando vingança e redenção. Marta, uma jovem cética, decidiu que era o momento perfeito para ver se havia alguma verdade nessas lendas.

Ela havia crescido em uma pequena cidade onde histórias sobre a noite dos espíritos faziam parte do folclore local. No entanto, sua racionalidade sempre superou sua curiosidade sobre o sobrenatural. Naquela noite, ela se reuniu com seus amigos: Javier, um amante de teorias da conspiração, e Ana, uma sensitiva que afirmava sentir a presença do paranormal. Marta achava isso ridículo, mas a ideia de vivenciar algo inexplicável a intrigava.

O grupo aventurou-se na floresta, um lugar temido pelos locais. À medida que se aprofundavam, a atmosfera tornava-se mais densa. O estalar de galhos sob seus pés parecia ressoar no silêncio da noite. A lua, escondida atrás de nuvens espessas, mal iluminava o caminho, e uma sensação de opressão começou a tomar conta de Marta.

“Você tem certeza de que quer fazer isso?” Javier perguntou, uma risada nervosa tremendo em sua voz. Marta deu de ombros, tentando disfarçar seu crescente desconforto. No entanto, Ana, com seu olhar intenso, a instou a continuar. “Esta noite é especial. Os espíritos estão mais perto de nós,” disse ela, enquanto as árvores pareciam se inclinar em direção a eles, como se quisessem ouvir.

Ao chegarem a uma clareira, encontraram um antigo altar de pedra coberto de musgo e vinhas. Ana começou a murmurar palavras em uma língua que Marta não entendia, e logo a atmosfera mudou. O ar ficou frio, e um silêncio aterrador envolveu o lugar. No entanto, o que enviou um calafrio pela espinha de Marta foi a sensação de estar sendo observada. Ela olhou ao redor, mas havia apenas sombras dançantes.

De repente, um sussurro arrepiante cortou o ar. “Voltem…” ressoou, e todos congelaram. Ana, com os olhos bem abertos, gritou: “Sinto a presença deles!” Javier, visivelmente assustado, sugeriu que eles fossem embora, mas Marta, movida por uma curiosidade inexplicável, insistiu em ficar.

Horas se passaram em um turbilhão de risadas nervosas e olhares inquietos. No entanto, quando Ana sugeriu invocar os espíritos, um ar pesado desceu sobre eles. Marta sentiu o chão tremer levemente sob seus pés, e uma voz profunda e gutural ressoou em sua mente: “Eles não estão prontos.”

A voz parecia vir de todos os lugares e de lugar nenhum ao mesmo tempo. Em um instante, Ana caiu no chão, tremendo. Marta, aterrorizada, se aproximou dela, mas Javier, pálido e com os olhos arregalados, gritou para que eles fossem embora. “Eles estão nos prendendo!” exclamou. No entanto, algo no olhar de Ana a deteve. A garota parecia estar em transe, sorrindo de uma maneira que não parecia natural.

“Eles me escolheram,” disse Ana com uma voz que não era a sua. Marta sentiu o medo tomar conta de seu corpo, e um grito abafado ecoou em sua mente. Javier, com o rosto pálido, começou a recuar. “Não quero ficar aqui!”

Marta, dividida entre a luta de seus amigos e sua fascinação pelo desconhecido, continuou a olhar para Ana, que parecia flutuar no ar, cercada por sombras sussurrando palavras que ninguém conseguia entender. As sombras se aproximaram de Marta, preenchendo-a com um terror indescritível. Ela não conseguia se mover, como se algo invisível a mantivesse no lugar.

De repente, uma luz brilhante surgiu no centro da clareira, e os gritos de sua amiga ecoaram em seus ouvidos. Quando a luz se dissipou, Ana estava de pé, mas sua expressão era diferente. Havia uma mistura de terror e alegria em seu rosto. “Eles me deram um propósito,” disse ela, e seus olhos brilhavam com um estranho brilho.

Marta e Javier se olharam, incertos sobre o que fazer. Com um movimento, Ana estendeu a mão, convidando-os a se aproximar. “Não tenham medo,” disse ela, mas o tom em sua voz era inquietante, como se algo mais tivesse tomado conta dela. A noite ficou ainda mais escura, e o vento uivava mais alto.

Sem aviso, Marta sentiu uma forte puxada em seu peito, como se uma força invisível estivesse tentando despedaçá-la. “Ajuda!” ela gritou, agarrando-se a Javier, mas ele já havia recuado, horrorizado com o que estavam testemunhando. “Não posso ficar aqui.”

Com o coração disparado, Marta se virou para Ana. “Você não é você mesma!” gritou, e naquele momento, o rosto de Ana se distorceu. As sombras ao seu redor se transformaram em uma massa escura que parecia querer devorá-la.

Com um último esforço, Marta se virou e correu, guiada pelo instinto. As risadas e sussurros dos espíritos a seguiram, ecoando em sua mente. Ela não sabia para onde estava indo, mas a única certeza que tinha era que precisava escapar. Na escuridão, a floresta parecia se fechar ao seu redor, mas o eco de seus passos ressoava como um aviso.

Quando finalmente emergiu da floresta, a lua iluminou seu caminho, e um silêncio aterrador a envolveu. Ela olhou para trás, mas Ana e Javier haviam desaparecido, consumidos pela noite dos espíritos. Uma sensação de vazio a invadiu, e enquanto o vento continuava a sussurrar, Marta percebeu que nem todos os segredos deveriam ser desenterrados. A noite a marcou, e embora ela tivesse escapado fisicamente, uma parte dela permaneceria presa entre sombras, esperando por um novo encontro.