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A porta que não deve ser aberta

19 octubre, 2024

A casa Salazar estivera vazia por anos, envolta em rumores e mitos que a cercavam. Os moradores da cidade sussurravam sobre uma porta que nunca deveria ser aberta, uma porta que levava a segredos melhor deixados esquecidos. Mas para Lucas, um jovem curioso com uma mente inquieta, esse aviso apenas alimentava seu desejo de explorar.

Numa noite de outono, quando as folhas caídas cobriam o chão como um cobertor crocante, Lucas decidiu se aventurar na propriedade. A lua cheia iluminava fracamente seu caminho enquanto o vento soprava com um sussurro ominoso. Apesar da atmosfera escura e opressiva, ele não conseguiu resistir à tentação de descobrir o que havia por trás daquela porta. Ele ouvira histórias de sua mãe sobre um velho que desaparecera na vila, um velho que era obcecado pelo oculto.

Ao chegar à casa, a porta da frente estava entreaberta, como se convidasse Lucas a entrar. O interior estava coberto de poeira e teias de aranha, o ar estagnado com o passar do tempo e a decadência. As paredes estavam adornadas com retratos da família Salazar, seus olhares vazios parecendo segui-lo enquanto ele se aventurava mais para dentro. A inquietação crescia dentro dele, mas sua determinação o empurrava para frente.

Finalmente, ele chegou à porta proibida, localizada no final de um corredor escuro. Era uma porta de madeira sólida, esculpida com símbolos estranhos que pareciam ganhar vida sob a luz da lua. Lucas sentiu um arrepio percorrer sua espinha, mas não podia voltar atrás. Com um movimento trêmulo, ele girou a maçaneta e empurrou a porta.

Quando ela rangeu ao abrir, um ar frio o envolveu, e um estranho cheiro de terra úmida e ervas secas inundou seus sentidos. O quarto estava mal iluminado, mas ele conseguiu distinguir uma mesa no centro, coberta com livros antigos e objetos desconhecidos. No entanto, o que mais chamou sua atenção foi um espelho na parede oposta, sua superfície escura, como se absorvesse a luz.

Ao se aproximar do espelho, ele sentiu uma atração irresistível. Em seu reflexo, ele não apenas viu sua própria imagem, mas também uma sombra que parecia se mover atrás dele. Lucas virou-se abruptamente, mas não havia nada lá. Ele voltou seu olhar para o espelho e viu a sombra se aproximando, embora não conseguisse distinguir o que ou quem era.

Seu coração disparava em seus ouvidos, e uma voz sussurrante começou a preencher o quarto. “Aproxima-se, Lucas. Liberta-me,” disse a voz, e algo em seu tom o envolveu em um transe hipnótico. Incapaz de resistir, ele estendeu a mão em direção ao espelho, e no momento em que seus dedos tocaram a superfície, tudo ficou negro.

Quando ele voltou a si, estava de volta ao salão principal, mas algo havia mudado. A atmosfera estava carregada com uma energia perturbadora, como se a casa estivesse respirando ao seu redor. Sombras pareciam se mover mais livremente, e os retratos nas paredes pareciam ter ganhado vida, seus olhos agora cheios de tristeza e aviso.

O pânico começou a tomar conta dele. Ele tentou sair da casa, mas as portas estavam seladas, como se a casa não quisesse deixá-lo ir. Em sua desespero, começou a ouvir risadas, as risadas de crianças que não deveriam estar ali. Ele olhou ao redor e viu figuras tênues emergindo das sombras, seus rostos distorcidos e cheios de terror.

“Por que você não veio antes?” perguntou uma das sombras, e Lucas sentiu um nó em seu estômago. “O que você fez?” ele gritou, mas sua voz se perdeu no eco dos lamentos que preenchiam a casa. Foi então que ele se lembrou do aviso de sua mãe sobre a porta que nunca deveria ser aberta. Ele havia libertado algo que nunca deveria ter sido solto.

Em uma tentativa final de escapar, ele correu em direção à porta da frente, mas em vez disso encontrou a porta do quarto proibido. Agora estava fechada, e uma risada zombeteira ecoou ao seu redor. “Você não pode escapar,” disse a voz, agora mais alta e clara. “Você é um de nós.”

Com seu coração acelerado, Lucas sentiu o desespero o envolver. A escuridão o havia aprisionado, e os rostos daqueles que um dia foram humanos o encaravam das sombras. Ele não conseguia distinguir a realidade do pesadelo. A casa havia reivindicado sua alma, e embora tentasse lutar, percebeu que estava destinado a ser mais um sussurro na lenda da vila esquecida.

A porta nunca deveria ter sido aberta, e agora era tarde demais para se arrepender. Enquanto risadas e gritos se misturavam em um coro de desespero, Lucas entendeu que não havia como escapar do que havia libertado. O medo psicológico se tornara sua única realidade, e o eco de seu próprio grito ressoava na escuridão, perdido para sempre na casa Salazar.